domingo, 30 de janeiro de 2011

O dueto de Marcia Castro e Tom Zé

Em 2008, Tom Zé criou sua própria homenagem aos 50 anos anos de Bossa Nova. E sendo Tom Zé, nem de longe seria algo convencional, uma mera regravação de clássicos, nada disso. Tom Zé compôs novas músicas, novas abordagens em torno do movimento.
Depois de tudo feito, juntou-se a Patrícia Palumbo em busca de cantoras que pudessem dividir os vocais nas faixas. Estão lá: Zélia Duncan, Marina De La Riva, Fernanda Takai, Andréia Dias, etc... E é claro, Márcia Castro, que foi convocada para cantar "O Filho Do Pato".

Sobre essa música, deixo vocês com uma bela análise de Leonardo Davino em seu novo blog Lendo Canção. E logo abaixo, o player para executar a música. Deliciem-se!

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O disco Estudando a bossa (2008) é Tom Zé revelando-nos mais uma vez suas inquietantes ideias sonoras sobre a canção.
O tropicalista despojado de qualquer atitude de discípulo destrona a bossa nova pai-e-mãe, refaz caminhos melódicos solares e percorre graças e otimismos temáticos para ensaiar e cantar a musa bossa nova.
O disco Estudando a bossa tenta (ensaia) cortar os laços de paternidade. Ele vai contra a corrente dos que apenas repetem gastos discursos de louvor a bossa nova a fim de exercitar o pensamento de todos os músculos que sentem a genealogia da canção popular brasileira não como evolução, mas como um eterno retorno em perspectiva.
Sem dúvidas, "O filho do pato", de Tom Zé e Arnaldo Antunes, estabelece direta intertextualidade com o clássico bossanovista "O pato". Mas é no derradeiro verso da canção que encontramos uma possível chave de interpretação: "ti-tico no fubaco, ensaiando o vocal". Chave que seja para entrar nas duas canções.
A canção "O filho do pato" é um ensaio sobre os modos de vocalização da bossa nova e sua vontade de desfazer o império passional de até então. Ao invés das inflexões melódicas e dos excessos semânticos, o sujeito investe nos acordes dissonantes.
A performance vocal titubeante (idas, vindas e torneios sonoros: fragmentos de sons) dos intérpretes Tom Zé e Márcia Castro de "O filho do pato" rompem com qualquer intenção estática que por ventura possa surgir no ouvinte. O sujeito quer incomodar: forçar o movimento e o pensamento. Sem desprezar os conteúdos emotivos, o sujeito quer o corpo e o cérebro do ouvinte em movimento.
Para tanto, ele figurativiza situações metaforizadas do cotidiano e chama atenção para a fala ordinária. Na voz que canta há uma cadeia proliferante de avanços, recuos, cortes e justaposições de sons comuns na fala cotidiana; na voz do indefectível pato.
A paródia irônica porque amorosa feita à canção "O pato", de Vinicius de Moraes, Toquinho e Paulo Soledade, é pontual e clara: reconstrói o conteúdo infantil ao tratar do afeto e usa uma dicção também infantil, desautomatizada e livre. Tudo para mostrar a radicalização estética promovida pela bossa nova: ao invés do excesso, precisão.

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